O assunto mais recorrente quando se fala em viver fora do país é a adaptação cultural. Muita gente acha que é um processo que tem que ocorrer, e ocorre, naturalmente quando se vai viver em outro país. Muitos ainda, também acreditam que qualquer pessoa que viva em algum país por um número X de anos, tenha um trabalho, um lugar para viver e amigos está adaptada e pode ser considerada um "entendedor" da cultura em que se inseriu. Em contrapartida, é costume também pensar que quem simplesmente viaja por um período curto de tempo para algum país não tem como saber muito sobre sua cultura. Está na hora de esses paradigmas caírem!
Hoje, li um texto muito interessante Validity Issues in Translating Instruments Acros Languages and Cultures: Exploring the Paradox of Differing Cultural Perspectives on Intercultural Sensitivity by Dr. Joe Greenholz ,sobre como se traduzir instrumentos de avaliação não só de uma língua para a outra, mas de uma cultura para a outra. O texto é muito interessante, mas longo e seu conteúdo na íntegra não vem ao caso, no entanto, ele cita um estudioso das relações interculturais, George Kelly, que diz:
"A person can be witness to a tremendous parade of episodes and yet, if he fails to keep making something out of them…he gains little in the way of experience from having been around when they happened. It is not what happens around him that makes a man (sic) experienced; it is the successive construing and reconstruing of what happens, as it happens, that enriches the experience of his life"
("Uma pessoa pode ser testemunha de um vasto repertótio de acontecimentos e, no entanto, se ela falhar em refletir sobre eles...ela ganha muito pouco com a experiência de ter estado presente enquanto eles aconteciam à sua volta. Não é o que acontece ao seu redor que torna um homem experiente; é a construção e reconstrução sucessiva dos acontecimentos, conforme eles ocorrem, que enriquece a experiência da sua vida")
No referido texto, o autor argumenta que o fato de uma pessoa estar presencialmente em outra cultura, não significa que ela será capaz de refletir e gerar conhecimento cultural a partir das experiências que está vivenciando. O que determina seu aprendizado é a reflexão. Esse sempre foi meu argumento ao justificar o trabalho de preparação cultural que fazemos na [ex]CHANGE Treinamento Cultural , estou cansada de ver pessoas que moram anos fora do país e voltam com frases do tipo "Esses gringos são todos porcos!", "Nossa as pessoas lá são muito frias, não dá para viver lá não!". Sempre me perguntei, como uma pessoa capaz de cunhar uma frase peconceituosa dessas pode se entitular "cidadão do mundo"? Como uma pessoa que tem a oportunidade de viajar o mundo todo pode voltar ao país e dizer que não há lugar como o Brasil, sem especificar em que quesito? O Brasil é o melhor em tudo?! Quem viaja o mundo e afirma isso, obviamente, não viu o mundo!
Existe uma teoria sobre o processo de adaptação cultural, quem quiser ler o texto que citei acima, ele explica um pouco do que essa teoria quer dizer e apresenta o seguinte resumo:
Essa teoria propõe que a maneira como essas fases vão se apresentar varia de acordo com o grau de diferença da cultura original para a cultura em que se está inserindo e nas particularidades do contexto, mas essencialmente o processo de adaptação segue os seguintes passos:
Negação: Fase em que se nega que as diferenças existam, até ainda por falta de contato real com a cultura. Isso ocorre quando a gente chega, não entende bem o que dizem, você é visitante, trata tudo e todos e é tratado como tal e não consegue "perceber" nada estruturalmente diferente.
Defesa: É a fase em que começamos a nos surpreender e indignar com as diferenças, defendendo nosso ponto de vista a qualquer custo! "O cara não me liberou para ir buscar o dinheiro que estava no mee escritório ao lado! Que falta de consideração! No Brasil as pessoas são mais humanas, aonde já se viu!"
Minimização: Esse é o momento em que a gente foca no que é parecido, e tenta ignorar o que é diferente como uma foma também de não mudar.A diferença principal dessa fase em relação à da defesa é que a indignação não é mais tão constante.
Aceitação: Essa é a fase em que a maioria das pessoas pára, mesmo após morar muitos anos fora, e acreditam que estão adaptadas porque entendem e aceitam que existam diferenças. "Eles são diferentes mesmo", "Ah, aqui eles são assim!"
Adaptação: Nesse momento a pessoa passa a faze da aceitção, e passa a entender; a maneira daquelas pessoas pensarem faz todo sentido para elas naquele contexto e desse entendimento advém a capacidade de interagir no mesmo nível.
Integração: Esse passo pode levar uma vida, e o indivíduo que o alcança geralmente é aquele indivíduo que chegou a um nível de entendimento de outras culturas tão cmplexo que ele não só aceita, entende e é capaz de se comunicar de acordo com valores culturais distintos, mas ele passa a incorporar valores de outras culturas. Esse passo só é alcançado mediante muita reflexão e é o passo que forma os verdadeiros cidadãos do mundo. São pessoas que não precisam negar nem defender sua própria cultura para interagir com outras culturas e podem transformar suas oportunidades de interação cultural em oportunidades também de entendimento e até, porque não, integração de valores ao mosaico cultural que se torna o seu referencial.
A boa notícia para os que não tem a oportunidade de viver fora é que o segredo de ser um "cidadão do mundo" não está na duração da experiência, mas ao valor atribuído a ela através da reflexão e deliberação consciente.
A má notícia para expatriados que pensam ou pensaram que adapatção ocorre naturalmente, é que a experiência intercultural mal conduzida pode ser tão danosa à vida de uma pessoa quanto qualquer outra experiência impensada e irresponsável.
A lição que fica da adaptação é que entendimento cultural nãoé "insight", é fruto de constantes reflexões e revisões. ANos após o término de uma experiência, ainda se pode aprender muito com ela.
sexta-feira, 20 de março de 2009
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